No Brasil, as coisas são feitas nas coxas. Se não tudo, quase tudo. Independe se estão defesa em lei. Pior. O nosso povo aceita tudo com a maior naturalidade, sem reclamar, do jeito que os nossos governantes gostam. A lei do mais forte economicamente, aliada a falta de informação da massa, a inércia dos que têm acesso à informação e a corrupção, é formada a cultura do "jeitinho brasileiro", do "rouba mas faz", do "deixa pra lá, que é pouco pra eu me aborrecer" e assim por diante.
Vamos ao mérito da questão. Quem compra um imóvel foreiro, ou seja, que esteja em terreno de Marinha, deve pagar no mês de junho, anualmente, uma "mesada" para União (ABSURDO!) de 0,06% sobre o valor da do imóvel na escritura. É chamado de FORO. Se não for pago, o sujeito vai à dívida ativa e etc. Pois bem. Não satisfeito, a União cobra também o laudêmio, que é uma renda da União (não é tributo, como muitos pensam) em toda transferência de bens imóveis em terrenos de Marinha. Colocando em ordem. Paga-se o foro em detrimento do laudêmio. A pergunta...
Quem paga o laudêmio? É o vendedor ou comprador?
Ai é que começa a má-fé lambança pois as construtoras, quando vendem seus imóveis, REPASSAM o laudêmio para o comprador pagar, como se tributo fosse. É uma pratica suja que já vem de anos. Acontece que é o VENDEDOR quem paga o laudêmio! É lei!
O art 2038 do código civil de 2002, reza a seguinte redação, remetendo-nos ao código civil de 1916:
Art. 2.038. Fica proibida a constituição de enfiteuses e subenfiteuses, subordinando-se as existentes, até sua extinção, às disposições do Código Civil anterior, Lei no 3.071, de 1o de janeiro de 1916, e leis posteriores.
§1º Nos aforamentos a que se refere este artigo é defeso (contra):
I - cobrar laudêmio ou prestação análoga nas transmissões de bem aforado, sobre o valor das construções ou plantações;
II - constituir subenfiteuse.
§ 2o A enfiteuse dos terrenos de marinha e acrescidos regula-se por lei especial
Pois bem. Esse artigo nos remete ao CC/16 no art. 686, que reza a seguinte redação:
Art. 686. Sempre que se realizar a transferência do domínio útil, por venda ou dação em pagamento, o senhorio direto, que não usar da opção, terá direito de receber do alienante o laudêmio, que será de 2,5% (dois e meio por cento) sobre o preço da alienação, se outro não se tiver fixado no título de aforamento.
Ou seja, SE NÃO USAR DA OPÇÃO, será o vendedor, o pagador. Realmente não tem nada defeso em lei que diga que é o comprador quem deva pagar DESDE que seja ACORDADO entre as partes. O que acontece????! As construtoras usam desse "fragmento de frase" da lei para inserirem na promessa de compra e venda uma cláusula - diga-se de passagem, bem discreta, que geralmente está inserida nas considerações finais, que é para passar desapercebida - que o ônus do laudêmio é do comprador.
Ou seja, o laudêmio PODE ser pago pelo comprador DESDE que ACORDADO entre as partes!
Muito espertamente, de forma SUJA e ILEGAL, as construtoras fazem com que essa informação equivocada, para não dizer litigância de má-fé, circule no mercado, tornando uma pratica entre eles e entre os corretores de imóveis. Estes, por sua vez, GARANTEM DE PÉS JUNTOS que o laudêmio deve ser pago pelo comprador. Seja ela por falta de informação (que acho pouco provável, pois vivem disso), seja por má-fé. Logicamente que ha exceções, mas a regra é que o corretor de imóvel diga que o comprador deve arcar com o ônus do laudêmio.
Certa vez, um corretor chegou a me dizer que eu poderia "entrar" na justiça que iria perder, porque cobrar laudêmio do comprador era de praxe. Não sou de ficar batendo boca com quem não entende nada do que está falando, mas nesse caso, o sangue subiu à cabeça e disse - não necessariamente com essas palavras - , "Meu senhor, não diga besteira. Não diga coisas que o senhor não sabe. Vá se informar!"
Lembrando que COSTUME NÃO REVOGA LEI!
Ou seja, É O VENDEDOR QUEM DEVE PAGAR O LAUDÊMIO!!!!
CUIDADO ao comprarem um imóvel. Antes de mais nada, pergunte se é foreiro. Se for afirmativo, diga que não pagará o laudêmio, pois não é dever do comprador. Ou se quiser muito o imóvel e o proprietário estiver irredutível, quanto a pagar o laudêmio, divida esse ônus, pois QUEM VENDE O IMÓVEL deve pagar! Há compradores que não se importam em pagar o laudêmio, mesmo sabendo que é o vendedor quem deve arcar com esse ônus. Lembrando que o laudêmio é, em média, 5% do valor do imóvel! É muito dinheiro para quem não tem a obrigação de pagar!!!
Volto a dizer. Laudêmio NÃO É TRIBUTO! O laudêmio é o direito de preferência da União. Exemplificando. Se eu estou alugando um apartamento e o proprietário quiser vender, por lei, ele terá que oferecer o apartamento para mim, antes de qualquer pessoa. Ou seja, eu exerço o direito de preferência sobre o imóvel que alugo. Se eu não quiser comprar, ele poderá oferecer para as outras pessoas. No caso do laudêmio é a mesma coisa. O apartamento está em terras de Marinha (ou indígena) e, portanto, eu teria que oferecer para a União o meu apartamento, antes de qualquer pessoa caso quisesse vender. Como seria inviável esse tipo de coisa na prática, já que são milhares e milhares de imóveis em terra de Marinha (ou indígena) e outras milhares de pessoas vendendo, a União resolveu cobrar do vendedor um valor sobre o imóvel toda vez que ele fosse vender o apartamento. Por isso que laudêmio NÃO É TRIBUTO e tampouco deve ser pago pelo comprador. Quem deve pagar é o VENDEDOR. Só que aqui no Brasil as coisas são diferentes. É uma zona! Ninguém respeita nada. Plagiando um ex professor meu, digo que o brasileiro tem o dom de estragar o que está bom e de piorar o que já está ruim.
Para finalizar o assunto. O não pagamento do laudêmio, depois de já ter comprador o imóvel, não tem nenhuma complicação legal (jurídica). O comprador pode ficar anos sem pagar o laudêmio que nada lhe acontecerá do ponto de vista legal. O impedimento será na hora de fazer a escritura definitiva do imóvel, que só poderá ser feita após o pagamento do laudêmio. Ou seja, o seu imóvel estará no nome da pessoa de quem você comprou.